terça-feira, setembro 29, 2009

O Passado no Presente

O tema do passado é fundamental. Em termos ontológicos, o passado já não existe. O que existe é a memória (que é mutante) e as consequências que as acções do passado têm na forma como o presente está estruturado.
Quando um movimento procura estabelecer um novo paradigma político, um dos processos mais eficazes é a manipulação da memória.

Temos que deixar de pensar na história como um conjunto de acontecimentos que existem de per si. A imagem que temos do passado é sempre perspectival; ou seja, é sempre uma construção cultural que parte do ponto de vista e dos interesses de quem detém o poder de produção da história.

Qualquer regime baseia-se sempre num conjunto de parâmetros culturais, numa mentalidade (ou visão do mundo). Destes parâmetros faz parte a memória histórica. Daí que qualquer mudança política seja sempre precedida de uma mutação espiritual. É que para chegar ao poder não chega fazer um "putsch". É preciso que o novo regime faça sentido à luz do sistema de valores dominante. Isto porque um regime, ainda que não seja populista, precisa de ter nas suas mãos o coração de uma parte significativa da população.

Quando se pretende agir politicamente há três atitudes possíveis em relação ao passado:
- A ruptura absoluta, característica da modernidade como fenómeno cultural. Em nome de um certo conceito de progresso, a modernidade procurou "arrumar" com o passado para um canto (religião, tradições, etc).
- A evolução, no sentido de aperfeiçoamento, do passado. Este processo foi escolhido por Marcello Caetano a partir do momento em que tomou conta dos destinos da Nação. Actualmente também existem "renovadores". O trabalho destes indivíduos é quase sempre ingrato, quando tentam salvar um regime cuja entropia é irreversível.
- A restauração. Trata-se de criar uma ponte entre o presente e uma dada época histórica cuja memória nos provoca a sensação de saudade. Qualquer coisa que não esteja ligada à memória histórica é kitsch, dá-nos sempre uma sensação de artificialidade e "mau gosto".

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