quinta-feira, julho 25, 2013

Como os consumidores vêm as suas próprias características nos produtos que possuem.

Como os consumidores vêm as suas próprias características nos produtos que possuem.
A posse de um objecto é essencial para o processo de projecção.
Se o produto não for seu, o consumidor não se projecta, de acordo com o trabalho: 

Egocentric Categorization and Product Judgment:
Seeing Your Traits in What You Own
(and Their Opposite in What You Don’t) 
por 
Liad Weiss, Gita Venkataramani Johar
Columbia University 

quarta-feira, junho 26, 2013

Um homem feliz

Enquanto trabalhava no norte de Portugal, conheci um carteiro aposentado, proprietário de uma pequena quinta, que cultivava com as suas próprias mãos. Tinha uma expressão facial afável, desgastada pelo tempo e pelo trabalho duro sob a agrura do frio húmido que se faz sentir na região. Esboçava um sorriso tímido, de vez em quanto. Não era homem de grandes espalhafatos nem de expressões abertas. Era geralmente reservado, excepto quando já tinha ganho alguma confiança com a pessoa recém-chegada. E então gostava de falar da sua terra, aquela mesma que habitava desde o nascimento, dos seus antepassados de origem humilde e dos hábitos quotidianos. Quem apenas o ouvisse, sem estar atento aos seus actos, ficaria convencido que aquele homem não se regia por moral alguma. Nunca o ouvi falar do bem e do mal, nem de expressões julgadoras ou do dever de quem quer que seja. Era preciso estar mesmo atento ao dia-a-dia daquele Ser para o entender. Levantava-se de manhãzinha (com um frio gélido) para ir sozinho a Igreja mais próxima praticar as suas orações, confessar-se a Deus e reafirmar a sua lealdade perante o Todo-Poderoso. Depois, voltava à quinta ou, se alguém necessitasse da sua ajuda (ainda que fosse um estranho), dedicava toda a manhã ao trabalho. Não era um homem fisicamente robusto, mas vi-o muitas vezes empregar todas as suas forças para ajudar a carregar fardos pesados. Cultivava a terra com as suas próprias mãos, ou seja, sem a ajuda de aparelhos agrícolas sofisticados que hoje em dia permitem executar tarefas num piscar de olhos. A verdade é que ele gostava de mexer na terra. Mexia nos torrões como se fizessem parte do seu corpo, com o mesmo amor com que um pai acaricia os pés do filho.
A caça e a apicultura faziam também parte dos seus afazeres. Partilhava sempre com os amigos o produto destas actividades. Ainda hoje me recordo do sabor do mel e das lebres que ele me ofereceu.
Nunca o vi fazer mal a quem quer que seja, mas assisti ao perdão espontâneo que lhe saía naturalmente dos olhos quando alguém o prejudicava.
Era praticamente analfabeto, mas sabia tudo o que precisava saber. Sabia quem era e onde estava, sabedoria essa que nem todos partilhamos. Não tinha opiniões nem causas políticas, mas tinha raízes. Nunca conheci outro ser humano tão coerente.
Quando me lembro de certos senhores cheios de conhecimentos livrescos, de vaidade intelectual, de insuficiências e frustações que tentam mascarar com um “estatuto”, vêm-me à ideia aquele homem telúrico, mil vezes mais Feliz do que o mais granjeado intelectual.
Há mais verdade num homem que cultiva a terra com as suas próprias mãos do que no mais erudito discurso patriótico. Quem se orgulha dos livros que leu, baixe os olhos e reflicta se não teria mais valor uma tendinite adquirida a ajudar o próximo.

quarta-feira, abril 10, 2013

O (Des)acordo Ortográfico

Reproduzo aqui um artigo do escritor Fernando Cardoso, publicado a 4 de Outubro de 2010, na revista online Livros e Leituras. Continua tão actual como no dia em que foi escrito.

"Acordo ortográfico revelou-se mais político do que linguístico" 

 

«Às hodiernas sociedades colocam-se questões de extrema complexidade relativamente às quais é possível elencar poderosos e argutos argumentos quer a favor de uma determinada orientação quer em defesa da posição oposta. Basta ter presente os inúmeros e rigorosos debates realizados e os rios de tinta consumidos acerca de temas como o aborto, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a eutanásia, a clonagem, o testamento vital, etc., etc…


O tema, objecto do presente artigo, é também ele genitor de enorme controvérsia. Com efeito, há quem defenda, de forma entusiasta, o Acordo Ortográfico e quem, por seu turno, o rejeite acerrimamente.


Vejamos, muito sucintamente, quais os principais argumentos invocados pelos que defendem o Acordo Ortográfico: 1º Assegurar a unidade da língua portuguesa entre todos os países que a têm como oficial com o objectivo de a fortalecer; 2.º Simplificar a escrita; 3.º Contribuir para a difusão internacional do português.


No que concerne ao 1º argumento, diremos que tal ilação é inverídica, porquanto a projecção de uma língua não depende de uma união ortográfica, mas de muitos factores. Basta ter presente que o inglês ostenta variadas divergências quer gráficas quer não-gráficas entre os países onde é falado, o que não obstou a que se tornasse, de forma natural e não espartilhada (o que esperanto, em vão, tentou) a língua internacional por excelência.


No que tange ao 2º argumento, há que convir que a utilização de duplas ou múltiplas grafias possíveis no interior de cada país, que o Acordo Ortográfico incongruentemente permite, em vez de simplificar, dá lugar ao livre arbítrio por parte de cada cidadão na escolha da grafia, pondo em causa o próprio conceito normativo de ortografia.


Direi, por outras palavras, que o Acordo Ortográfico visa a uniformidade ou unificação da grafia na língua portuguesa e, simultânea e incoerentemente, viabiliza a sua diversidade no seio de cada país.


Relativamente ao 3º argumento a favor do Acordo Ortográfico, há que reconhecer que não é a existência de divergências ortográficas que impedem a sua expansão.


Há, outrossim, que reconhecer que o gérmen do Acordo in causa revelou-se mais político do que linguístico, tendo-se manifestado interesses empresariais brasileiros, nomeadamente no domínio do mercado editorial da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.


Mas uma coisa é certa: não é com a unidade da ortografia que o Brasil e os restantes países da CPLP passam a adquirir maior número de publicações a Portugal. E acresce que, com o Acordo Ortográfico, as editoras portuguesas que já se encontram numa situação de extrema fragilidade, confrontar-se-ão com as suas publicações “desactualizadas”.


Censuram os apologistas do Acordo Ortográfico que não entendem os opositores, porquanto a grafia da língua portuguesa tem evoluído. Mas tal argumento é inconsistente: na realidade, a língua portuguesa tem evoluído ao longo da sua existência, mas paulatinamente e por razões internas ― verdadeira evolução! ―, e não imposta do exterior, como ora se pretende.»

sábado, março 09, 2013

Anúncio institucional criado por Rankin


Este anúncio é extremamente eficaz. Começa por captar a atenção do público-alvo, depois cria um efeito-surpresa para - imediatamente - transmitir a mensagem de uma forma muito clara.

Aconselho vivamente o sítio do autor, com diversos trabalhos (fotografia e filme).   rankin.co.uk

sábado, fevereiro 23, 2013

Tácticas de persuasão (publicidade)


- Reciprocidade: oferecer amostras grátis pode levar a que as pessoas adquiram o produto por inteiro. Tal fenómeno baseia-se na tendência em retribuir um favor.
- Consistência: a partir do momento em que uma pessoa já decidiu o que fazer, e mantém a sua decisão, a origem motivacional pode ser alterada. Por exemplo, quando escolheu comprar um determinado automóvel, o preço pode ser alterado à última da hora, uma vez que a decisão já está tomada.
- Influência social: esta táctica divide-se em acordo, identificação e internalização.


·        Concordância – quando uma pessoa está em sintonia com as outras.


·        Identificação – respondemos à influência de alguém com fama, uma celebridade, por exemplo.


·        Interiorização – a aquisição de hábitos, normas, ideias ou valores.


- Autoridade: somos influenciados por figuras com um determinado status social (a autoridade) que lhe é conferida por uma comunidade (científica, literária, desportiva, etc).
- Empatia: somos mais influenciados por pessoas com as quais nos identificamos. Isto quer dizer que criamos empatia com alguém que reconhecidamente é parecido connosco. Atenção que a nossa auto-imagem é uma ideação, é o que pensamos de nós próprios. Como tal, para que alguém exerça influência sobre nós, por empatia, deva ter também uma boa imagem, ainda que nós não a tenhamos.
- Escassez: uma forma de influenciar o público no sentido de ir à procura de um determinado produto é convencê-lo da sua escassez. Colocar limites à oferta aumenta o valor e, por consequência, a procura. 
- Dar mais por menos: um exemplo desta táctica são as embalagens tamanho-familiar de um determinado produto. A empresa que o comercializa coloca à venda unidades com maior quantidade de produto a um preço inferior ao de duas unidades menores cujo peso conjunto seria equivalente ao da embalagem tamanho familiar. Esta táctica faz com que o consumidor sinta que está a poupar.

quinta-feira, outubro 18, 2012

Um Bom Anúncio...



Um bom anúncio deve conseguir criar uma associação na mente do público entre o produto e uma identidade ou emoção. Este processo ocorre sem que o público se aperceba, de forma a receber o conteúdo do anúncio sem resistência crítica. Mais tarde, o sujeito x terá vontade de comprar algo, porque uma determinada emoção ou identidade já está associada ao produto y.


- A ambiguidade entre várias formas de prazer. Quando o bem de consumo tem como principal função dar prazer ao seu consumidor o publicitário procura reforçar esta noção acrescentando outras formas de prazer. Por exemplo, os anúncios de doces (gelados, bombons, etc) estão quase sempre carregados de conotações eróticas. O erotismo tem, necessariamente, que ser implícito uma vez que o que se pretende é aumentar a ideia de prazer em abstracto.
- As cores. Quando se trata de promover um objecto a cor é um assunto importante. Objectos dirigidos ao prazer efémero têm, normalmente, cores quentes (vermelho, amarelo e dourados). Quando se procura que um produto evoque a excelência do progresso científico os tons eleitos são os metálicos (prateados, cromados, etc). O azul e o verde são também muito utilizados pela indústria informática.
- Casar o objecto com uma identidade pessoal. O slogan Só Para Homens é um exemplo de como um after-shave pode ser transformado num símbolo de masculinidade (isto é, de identidade masculina). Uma campanha que eu achei particularmente interessante foi a da citroen envolvendo a modelo Cláudia Schiffer. Eu ouvi várias interpretações simplistas quanto à estratégia por detrás desta campanha. A mais vulgar que eu ouvi foi: “Eles querem que a gente pense que se comprar o citroen xara leva também a Cláudia”. Se a mensagem dos anúncios fosse assim tão directa não teria funcionado. Realmente, a campanha dirigia-se a um público maioritariamente masculino. No entanto, a estratégia era outra. Um dos anúncios terminava com o seguinte slogan: “Citroen Xara, instinto protector!”. Era nesta frase que poderíamos encontrar a verdadeira estratégia publicitária. Todo o enredo do spot procurava transmitir uma ideia de protecção e segurança para o ocupante do automóvel (a Cláudia). No nosso “inconsciente colectivo” a identidade masculina alicerça-se muito na função protectora em relação à mulher. Ao transmitir a ideia que o Citroen Xara é muito protector, a campanha conseguiu transformar um veículo mecânico num símbolo de masculinidade. A modelo Cláudia Schiffer foi bem escolhida, uma vez que cumpre a função de símbolo de feminilidade. Este tipo de estratégias funciona muito bem, uma vez que as pessoas estabelecem ligações (agregam-se) a objectos que têm a sua identidade. Um indivíduo sente-se “mais homem” se adquirir objectos conotados com a masculinidade.
- Os teasers. Um “teaser” é um anúncio com apenas parte da mensagem que se procura transmitir. É um método que visa provocar a curiosidade no sujeito. Pode funcionar, uma vez que capta a atenção e põe o indivíduo a pensar. No entanto, existe sempre o risco de desiludir quando a segunda parte da mensagem for exposta.
- O discurso oral. A publicidade foi buscar aos grandes oradores da história as estratégias para transmitir ideias através da voz. Seja via rádio ou através da voz-off de um anúncio televisivo, o método é quase sempre o mesmo: frases simples e perceptíveis por todos, em alto e bom som, repetidas sucessivas vezes. O tom de voz deve inspirar determinação (enérgico) mas deve ser em simultâneo descontraído e muito apelativo.
- Objectos que criam necessidades. Uma criança que compre uma barbie está necessariamente a comprar também um “conjunto de necessidades”. Mais tarde ou mais cedo, a barbie vai “precisar” de uma panóplia de adereços (roupas, o amigo Ken, etc). Quem compra uma consola de jogos, adquire a “necessidade” de periféricos (manípulos, memórias, câmaras, etc). Neste tipo de objectos, a publicidade procura “demonstrar” ao consumidor o poder que o produto oferece. A necessidade de adquirir objectos acessórios tem a ver com uma lógica de expansão do poder individual. Para a criança que tem uma barbie comprar o Castelo Mágico significa expandir o universo das brincadeiras, ou seja, ter mais poder de opção.
- A credibilidade de uma figura pública. Apresentar num anúncio alguém que é conhecido por todos e usar essa figura para “aconselhar” o espectador é criar uma “garantia” de honestidade («Este tipo não vai mentir porque toda gente o conhece»). Além disso, a figura pública induz um clima de familiaridade que aproxima o espectador do produto publicitado.

sexta-feira, agosto 24, 2012

O Erro de Cecília


O "restauro" do fresco feito por Cecilia Giménez, de 81 anos, ao original de Elías García Martínez está a originar uma verdadeira peregrinação ao Santuário de Nossa Senhora da Misericórdia de Borja, em Espanha.
            Passada a impressão inicial, a que nos levou a lançar as mãos à cabeça, analisemos este fenómeno com a acuidade que ele merece. D. Cecília, pintora menos do que amadora – infantil até – lançou-se ao restauro com materiais impróprios. Acabou por transformar o original numa imagem completamente diferente, nada realista, uma figura indefinida.
            Os admiradores da pintura de Elias Martínez devem ter ficado chocados. Mas se é verdade que esta idosa de Borja destruiu, não nos será permitido pensar que D. Cecília também criou?
            D. Cecília Giménez destruiu o Passado, uma figura pictórica realista, um retrato definido ao pormenor, representativo; para colocar por cima um Presente, um novo olhar, o seu ponto de vista.
            O que é que está agora no Santuário em Borja? Uma obra danificada ou outra coisa? Depende do ponto de vista, obviamente. Mas seguramente existe agora um novo artefacto: o erro de D. Cecília. Neste momento o erro tem um valor próprio, uma dimensão cultural e já foi apropriado socialmente. Nas redes sociais da Internet há dezenas de milhar de pessoas que se manifestam no sentido de que se mantenha a imagem como está. Centenas de visitantes querem vê-la.
            O erro de D. Cecília tem mais valor (social e, provavelmente, económico) do que a pintura original de Elias Martínez. Foi um erro muito bom. Está a beneficiar o Santuário e a localidade de Borja.

sábado, julho 28, 2012

A Identidade dos Objectos

O objecto é carregado de um valor simbólico como meio de comunicação e, como objecto passa a ser actor social, isto é, a intervir no mundo social que o criou. A existência social de qualquer objecto dá-se pelo posicionamento deste na rede de relações sociais. E é à posição que ocupa que podemos chamar a identidade do objecto. A identidade não é estática. Muito pelo contrário, ela é instável. À medida que a comunidade se altera, os juízos e os comportamentos em relação à obra também se alteram. A inconstância da identidade é bastante visível quando uma determinada peça é deslocada de um contexto para outro. Muda o contexto, muda a identidade. Quem escolhe está, sobretudo, interessado no tipo de sociedade em que vive. A selecção é um acto de aliança e, simultaneamente, um protesto contra um modelo de sociedade indesejado. Neste modelo, cada tipo de cultura é, pela sua natureza, hostil às outras. Todas as culturas coexistem num estado de antagonismo mútuo. Isto é válido para todas as sociedades e todas as épocas.
            Entende-se melhor o juízo do gosto tendo atenção às opiniões negativas. É que, muitas vezes, as pessoas não sabem bem do que é que gostam; mas, por oposição sabem quase sempre do que não gostam. E é por isso que o discurso sobre a fealdade e o repúdio é mais revelador do que os pressupostos de beleza estética. (1)
            Apesar do gosto se apresentar como algo inerente às coisas e às pessoas, as distinções (de bom e mau) são instáveis. Cada objecto pode ser classificado dentro do ‘bom gosto’ e do ‘mau gosto’. O mau gosto é associado ao efémero. O bom ao que perdura.
            O mau gosto é poluição social. O bom e o mau gosto circulam em torno de regras de ‘higiene social’. Nos objectos de ‘mau gosto’ tenta-se promover o aspecto ‘fabricado’ da obra. Sem uma genealogia, os objectos tornam-se ‘menos reais’ e ‘menos autênticos’. São vividos no momento. Uma vez que não conseguimos delinear um percurso temporal da emergência da obra, eles surgem-nos como que ‘caídos de pára-quedas’, transportando apenas o seu carácter de coisa fabricada. São falsos e efémeros.
            Por outro lado, há objectos que têm uma ‘identidade natural’, isto é, parecem que não foram criados por mãos humanas. ‘Encaixam’ no contexto em que aparecem, são mais estáveis e incorporam uma quinta-essência que os torna reais.
            O protesto é um aspecto do consumo que revela a coerência do consumidor. De uma maneira geral, o protesto é uma dimensão fundamental da cultura. Cada cultura acusa as outras permanentemente. Por isso, o comportamento de consumo é inspirado continuamente pela hostilidade cultural. Ao invés de pensarmos no consumo como manifestação das escolhas individuais, devemos vê-lo como o resultado de relações, nas quais o mecanismo da escolha reclama o tipo de sociedade em que se quer viver. Os artefactos são seleccionados por via de uma opção social. São escolhidos por não serem neutros, por não serem tolerados nas formações sociais rejeitadas. O que uns escolhem, outros rejeitam. Numa palavra, a hostilidade está implícita na selecção. “O consumo é uma filosofia de vida”. (2)
            A decisão essencial não ocorre entre tipos de bens materiais, mas sim entre tipos de sociedade, entre as posições sociais disponíveis.
            A semelhança entre dois objectos não explica a metáfora; é a prática de ajuizar dois objectos metaforicamente que constitui a semelhança. Isto porque os objectos não dizem a classe a que pertencem, as propriedades não anunciam semelhanças. São os agentes humanos que criam processos de organização do mundo em que vivem. No seio de um esquema cultural específico, as coisas são definidas por semelhança caso pertençam à mesma classe de critérios. Se os objectos tiverem os critérios necessários à inclusão numa classe comum, partilham uma identidade, têm uma semelhança. (3)

Referência: DOUGLAS , Mary, 1996, The World of Goods, Routledge, London & N.Y (1->p.43-50) (2->p.86) (3->p.128-149)

sábado, julho 14, 2012

Cinco "sentenças" sobre arte


1.      Arte é uma definição cuja aplicação depende de critérios mais ou menos explícitos validados ou não por uma comunidade socialmente reconhecida como detentora de autoridade técnica, interpretativa e institucional.
2.      Estética é o conjunto de práticas de construção e desconstrução de significados que têm por origem a informação sensorial.
3.      As práticas estéticas não são exclusivas de nenhum grupo social em particular. São universais. Fazem parte do sentido que fazemos do mundo circundante e acompanham todas as actividades humanas.
4.      A arte é uma tecnologia, isto é, um domínio específico da actividade humana dirigido à transformação da matéria. Mais, procura transformar a matéria com o intuito de dizer algo. É uma tecnologia de comunicação.
5.    Os objectos reflectem o mundo social circundante. Os critérios formais de cada objecto (as propriedades que o produtor fez nascer e aquelas que o receptor percepciona) são produto dos esquemas cognitivos partilhados pelo grupo que lhe dá vida social. É importante salientar que os padrões que servem para ajuizar a concepção e interpretação de objectos estão presentes em todas as actividades humanas. Isto quer dizer que uma conversa com o vizinho do lado, a aquisição de mobiliário para a sala, fazer o jantar ou pintar um quadro são práticas que dependem da mesma substância cultural. A grelha interpretativa partilhada por pessoas que viveram em circunstâncias similares  e que se exterioriza através de critérios de gosto pode ser encontrada nas mais diversas actividades.

domingo, julho 04, 2010

Sedução, Publicidade e Demagogia

«Se o objectivo do jogo é vencer, então o batoteiro é o único verdadeiro jogador » - Jean Baudrillard

A sedução pode ser definida como um processo através do qual se incita deliberadamente uma pessoa em direcção a uma resposta comportamental pré-determinada. Há muitas áreas onde a indução dos comportamentos se faz sentir. No entanto, a palavra “sedução” parece empurrar-nos para um tipo muito específico de influência : a sedução sexual. A sexualidade utilizada como instrumento para “regular” os comportamentos dos outros é sem dúvida um aspecto importante nas sociedades ocidentais. Contudo, é necessário salientar que há muitas formas de sedução para além da manipulação erótica.
Uma questão relevante dentro desta temática tem a ver com a relação entre sedução e poder. Serão a mesma coisa, uma vez que o poder pode ser definido como a capacidade de alguém impor a sua vontade aos outros? Ambos existem sempre em situações relacionais. Isto é, tem-se poder em relação a alguém e a sedução é sempre dirigida a outra pessoa. Portanto, não se pode dizer que “o sujeito x tem poder” ou que “tem sedução”. O poder e a sedução existem sempre num quadro de relações sociais. Apesar deste aspecto em comum, o poder envolve um leque de estratégias de controlo mais vasto. A coerção é um exemplo de poder que não diz respeito à sedução. Na minha opinião, a sedução é um dos aspectos do poder. Não são a mesma coisa mas o segundo engloba o primeiro.
A sedução baseia-se nos conhecimentos que um dado indivíduo possa ter relativamente ao perfil psicológico dos outros e à mestria de determinados métodos de persuasão. De uma forma simplificada pode-se dizer que seduzir é fazer alguém sentir a necessidade de levar a cabo uma determinada acção.
A questão das necessidades dos seres humanos é extremamente vasta e complexa. Todos conhecemos as necessidades fisiológicas (que procuram repor um determinado equilíbrio no organismo), os princípios de evitação da dor e de procura do prazer, as necessidades sociais (ou gregárias) e as culturais (às quais somos conformados desde a infância). No entanto, todas estas forças motivacionais podem ser manipuladas (transformadas na consciência do sujeito individual) e existe a possibilidade de fazer emergir novas necessidades. Eu não pretendo neste artigo classificar umas de “reais” e outras de “artificiais”. Parece-me inútil tentar definir a “genuinidade” de uma força motivacional. O importante é tentar descrever a dinâmica das necessidades para perceber como o comportamento dos indivíduos pode ser influenciado.
Um dos aspectos mais importantes da sedução é a criação de estados liminares. Uma condição liminar é aquela que existe entre dimensões, não é uma coisa nem é outra. Não tem uma categoria específica. Estes estados provocam quase sempre o fascínio e estimulam a imaginação. O crepúsculo (entre o dia e a noite), os géneros indefinidos (travestis, transsexuais, hermafroditas…), as encruzilhadas entre caminhos, são alguns exemplos de liminaridade. Nalgumas culturas, estas “zonas intermédias” têm conotações com o mundo da magia e do sobrenatural. A forma como são percebidas pelos seres humanos escapa aos mecanismos de categorização do real. Daí que sejam extremamente susceptíveis de evocar emoções e conduzir à fantasia. É por isso que a liminaridade é tão importante quando falamos de sedução. Para a sedução acontecer o sujeito tem que deixar fugir a estabilidade do real. Tem que se encontrar perante uma situação que não consegue explicar.
Há quem veja a sedução como um jogo, com regras próprias, no qual sedutor e seduzido dialogam através de estratégias comuns. Nada poderia estar mais longe da verdade. A sedução baseia-se na transgressão de normas, na desestabilização da consciência do sujeito e na subversão da percepção do real. Trata-se de um jogo de poder no qual a regra é a batotice. Consiste em fazer com que o sujeito perca o controlo consciente da situação e seja levado pelas “fintas” do sedutor. Para que o leitor compreenda melhor a “natureza batoteira” desta área passo a descrever, como exemplo, um possível “modelo” de sedução:
· Colocar o sujeito perante um objecto apetecível, ou seja, perante um ser que tem o potencial de satisfazer as suas necessidades mais imediatas.
· Procurar desinibir o sujeito.
· Criar um ambiente propício a que o sujeito se envolva, colocando-o num contexto que lhe parece “familiar” (e seguro).
· Evocar emoções ou sentimentos agradáveis e elementares (alegria, vaidade, curiosidade...)
· Ter sempre a preocupação que o sujeito tenha dificuldade em identificar o que sente. Provocar uma separação entre o que o sujeito sente e a consciência (reconhecimento) das suas próprias emoções ou sentimentos.
· Contornar a capacidade de antecipação do sujeito. Todos nós conseguimos, até certo ponto, prever as acções dos nossos interlocutores. Essa capacidade permite-nos “controlar” as situações e os nossos estados de espírito. Daí que o sedutor tenha que surpreender, contornando as “defesas” mentais do sujeito.
· Tentar que o sujeito confunda o que sente com o que o sedutor pretende que ele sinta.
· Dar a iniciativa ao sujeito para ir ao encontro do objecto. Nunca “empurrar” o objecto em direcção ao sujeito.
· Fazer um jogo de aproximação-distanciamento entre o sujeito e o objecto. Não se deve deixar que o sujeito alcance na totalidade o objecto, uma vez que isso provocaria o fim da motivação. Não se deve afastar completamente o objecto, uma vez que isso provocaria a resignação do sujeito. Este jogo de aproximação-distanciamento vai fazer com que o desejo aumente.

Como é óbvio, não há “fórmulas” concretas de sedução. O acto de seduzir é sempre um exercício de criatividade adaptado às características individuais do sujeito.
A expressão “sedutor” é muitas vezes utilizada com uma conotação negativa. O sedutor (ou sedutora) é frequentemente associado a actos de vigarice fria e calculista, como se tratasse de um burlão que se aproveita dos sentimentos dos outros para atingir objectivos egoístas. De facto, o mundo está cheio de oportunistas, com uma incapacidade para a empatia, e que, instrumentalizando os outros, conseguem obter benefícios pessoais. No entanto, eu não classifico estes indivíduos como sedutores. Isto porque a sedução é um jogo de criatividade que precisa de uma motivação emocional, ou seja, o sedutor tem que ser estimulado para que a sua fantasia possa nascer. Na minha opinião, há três “ingredientes” fundamentais que tornam um sedutor competente: a criatividade, o conhecimento sobre a natureza humana e a paixão. O sedutor mais motivado para “encantar” é aquele que já foi encantado. Normalmente, os oportunistas frios e calculistas são maus sedutores. Conseguem alcançar os seus intentos seleccionando “alvos” vulneráveis e utilizam quase sempre os mesmos estratagemas. Há pouca criatividade. Há é sentido de oportunidade.
Até agora analisei apenas a manipulação dos comportamentos no contexto das relações interpessoais. Este é um tipo de influência que se procura exercer sobre um único indivíduo ou sobre um pequeno grupo. Tão (ou ainda mais) fascinante é o “controlo mental” dirigido às massas. A preocupação com o imaginário e com a opinião dos colectivos deu origem, ao longo do século XX, a indústrias poderosíssimas de publicidade (com o intuito de promover a venda de bens de consumo) e de propaganda (com objectivos políticos). Estas instituições são, no fundo, fábricas de cultura. Ou seja, são mecanismos que promovem a transformação das visões do mundo, dos comportamentos e dos “estilos-de-vida”. Para levar a cabo esta tarefa, uma agência de publicidade terá que elaborar estratégias para “fintar” o espírito crítico das pessoas que constituem o alvo da campanha. A publicidade vai buscar algum conhecimento relativo à psicologia das relações interpessoais mas tem, sobretudo que se socorrer dos meios de influência visual. Passo a descrever algumas estratégias da publicidade patentes em anúncios televisivos, outdoors, etc:
- A ambiguidade entre várias formas de prazer. Quando o bem de consumo tem como principal função dar prazer ao seu consumidor o publicitário procura reforçar esta noção acrescentando outras formas de prazer. Por exemplo, os anúncios de doces (gelados, bombons, etc) estão quase sempre carregados de conotações eróticas. O erotismo tem, necessariamente, que ser implícito uma vez que o que se pretende é aumentar a ideia de prazer em abstracto.
- As cores. Quando se trata de promover um objecto a cor é um assunto importante. Objectos dirigidos ao prazer efémero têm, normalmente, cores quentes (vermelho, amarelo e dourados). Quando se procura que um produto evoque a excelência do progresso científico os tons eleitos são os metálicos (prateados, cromados, etc). O azul e o verde são também muito utilizados pela indústria informática.
- Casar o objecto com uma identidade pessoal. O slogan Só Para Homens é um exemplo de como um after-shave pode ser transformado num símbolo de masculinidade (isto é, de identidade masculina). Uma campanha que eu achei particularmente interessante foi a da citroen envolvendo a modelo Cláudia Schiffer. Eu ouvi várias interpretações simplistas quanto à estratégia por detrás desta campanha. A mais vulgar que eu ouvi foi: “Eles querem que a gente pense que se comprar o citroen xara leva também a Cláudia”. Se a mensagem dos anúncios fosse assim tão directa não teria funcionado. Realmente, a campanha dirigia-se a um público maioritariamente masculino. No entanto, a estratégia era outra. Um dos anúncios terminava com o seguinte slogan: “Citroen Xara, instinto protector!”. Era nesta frase que poderíamos encontrar a verdadeira estratégia publicitária. Todo o enredo do spot procurava transmitir uma ideia de protecção e segurança para o ocupante do automóvel (a Cláudia). No nosso “inconsciente colectivo” a identidade masculina alicerça-se muito na função protectora em relação à mulher. Ao transmitir a ideia que o Citroen Xara é muito protector, a campanha conseguiu transformar um veículo mecânico num símbolo de masculinidade. A modelo Cláudia Schiffer foi bem escolhida, uma vez que cumpre a função de símbolo de feminilidade. Este tipo de estratégias funciona muito bem, uma vez que as pessoas estabelecem ligações (agregam-se) a objectos que têm a sua identidade. Um indivíduo sente-se “mais homem” se adquirir objectos conotados com a masculinidade.
- Os teasers. Um “teaser” é um anúncio com apenas parte da mensagem que se procura transmitir. É um método que visa provocar a curiosidade no sujeito. Pode funcionar, uma vez que capta a atenção e põe o indivíduo a pensar. No entanto, existe sempre o risco de desiludir quando a segunda parte da mensagem for exposta.
- O discurso oral. A publicidade foi buscar aos grandes oradores da história as estratégias para transmitir ideias através da voz. Seja via rádio ou através da voz-off de um anúncio televisivo, o método é quase sempre o mesmo: frases simples e perceptíveis por todos, em alto e bom som, repetidas sucessivas vezes. O tom de voz deve inspirar determinação (enérgico) mas deve ser em simultâneo descontraído e muito apelativo.
- Objectos que criam necessidades. Uma criança que compre uma barbie está necessariamente a comprar também um “conjunto de necessidades”. Mais tarde ou mais cedo, a barbie vai “precisar” de uma panóplia de adereços (roupas, o amigo Ken, etc). Quem compra uma consola de jogos, adquire a “necessidade” de periféricos (manípulos, memórias, câmaras, etc). Neste tipo de objectos, a publicidade procura “demonstrar” ao consumidor o poder que o produto oferece. A necessidade de adquirir objectos acessórios tem a ver com uma lógica de expansão do poder individual. Para a criança que tem uma barbie comprar o Castelo Mágico significa expandir o universo das brincadeiras, ou seja, ter mais poder de opção.
- A credibilidade de uma figura pública. Apresentar num anúncio alguém que é conhecido por todos e usar essa figura para “aconselhar” o espectador é criar uma “garantia” de honestidade («Este tipo não vai mentir porque toda gente o conhece»). Além disso, a figura pública induz um clima de familiaridade que aproxima o espectador do produto publicitado.

Na publicidade política (propaganda) estão, e sempre estiveram, grandes manipuladores. Adolph Hitler, com todos os defeitos que se lhe conhecem, foi um estratega extremamente eficaz no que toca à propaganda. Passo a descrever alguns aspectos desta “competência” hitleriana:
- A criação da bandeira nazi. Hitler foi buscar a suástica ao ocultismo alemão, colocou-a sobre um disco branco centrado numa bandeira vermelha. Criou um ícone extremamente forte, de reconhecimento imediato e singular. Utilizou-o invertendo a lógica do simbolismo. Um símbolo é sempre a representação de algo que já existe; a bandeira nazi é a representação de algo que está para vir.
- Como orador, gritava electrizando a multidão, transmitindo uma imagem de força e de certeza. A pose era firme, só a cabeça e os braços mexiam. O gesticular de Hitler foi treinado, procurando mimetizar os “passes mágicos” de um ilusionista. Tudo isto para criar uma aura sobrenatural, acrescida pelo seu olhar penetrante iluminado pelo azul intenso dos olhos.
- O discurso simples e furioso ia ao encontro dos sentimentos das massas. Descrições maniqueístas dividiam a Alemanha entre os absolutamente bons (arianos) e os absolutamente maus (judeus). Citando o próprio Hitler: «não se pode apontar vários inimigos ao povo senão o ódio dispersa-se; só pode haver um único inimigo para que a mobilização seja absoluta.».

Já o “nosso” Salazar não era tão dotado para a manipulação popular. No entanto, a capacidade que lhe faltava para gerir o espírito das multidões era compensada por uma profunda destreza no “um-para-um”. Tinha:
- Uma intuição quase sobrenatural para detectar as ambições dos que o rodeavam.
- Conseguia esconder as suas intenções e fazer com que as pessoas o conduzissem ao poder.
- Fingia-se de fraco para que os adversários tivessem confiança suficiente para mostrar a cara.
- Colocava-se quase sempre numa “posição neutral” entre as forças dominantes, de maneira a poder geri-las.

Os políticos das chamadas “democracias ocidentais” são mais completos, na minha opinião, no que toca a estratégias de manipulação:

- Utilizam ícones simples e apelativos nas campanhas.
-Têm uma aparência que procura evocar “estabilidade”, “bom senso” e “moderação”. Predominam os fatos azuis-escuros e cortes de cabelo discretos. O professor Cavaco Silva surgiu no segundo mandato enquanto primeiro-ministro com umas “entradas brancas”, que transmitiam uma certa “maturidade”.
- No discurso evitam formular opiniões que os comprometam.
- Utilizam frequentemente expressões como “democracia”, “liberdade”, “desenvolvimento”, “progresso” e “futuro”. Estas expressões foram sempre de difícil definição e, graças ao uso indiscriminado, foram perdendo o significado concreto. Actualmente, são palavras que não querem dizer nada mas que evocam sentimentos positivos nas massas.
- São mutantes eternos e constantes. A identidade política de cada um é inconsistente, fluida, de forma a permitir a sobrevivência do político em qualquer contexto. São muito dinâmicos os políticos profissionais das “democracias parlamentares”.
- Nunca negam o que é óbvio. Afirmam-no de maneira a ganhar credibilidade.
- Procuram transmitir uma imagem de descontracção e bom humor. Mostram que têm muitos amigos e que o povo está com eles. Isto dá-lhes uma imagem de poder.
- Gostam de tornar pública uma imagem de vida familiar estável. Desta forma, conseguem uma empatia com o público.
Eu não considero que os políticos e os publicitários na sua maioria sejam verdadeiros sedutores. Como eu procurei explicar, a sedução pressupõe um envolvimento emocional entre sedutor e seduzido. A manipulação presente na publicidade e na demagogia não tem a emoção e a fantasia como principais fontes de motivação. Não excluo a possibilidade de um político se apaixonar pelo povo e conseguir seduzí-lo através da expressão do seu deslumbramento. No entanto, a maioria serve-se de técnicas por demais conhecidas. A capacidade de surpreender é quase nula na política e na publicidade, e isto é um sintoma do distanciamento entre quem manipula e o objecto da manipulação.
A sedução é algo maravilhoso. É a arte de fazer com que os outros sintam o que nós sentimos.

segunda-feira, junho 07, 2010

Consumo e Suas Conotações

Uma forma simples de definir o consumo pode ser esta: a utilização de um recurso que não foi produzido por nós. Esta definição reflecte claramente a separação de duas esferas – a da produção de um determinado artefacto e a da sua apropriação.
O consumo enquanto conceito é uma invenção da Economia. Pelo menos nos últimos cem anos, esta ciência tem invadido a nossa forma de conceber o mundo. Expressões correntes como “produção em massa”, “oferta e procura”, “gestão de recursos” são alguns exemplos de como a cultura da Economia penetrou no quotidiano das sociedades ‘ocidentais’. A nossa forma de pensar foi, ao longo do tempo, adquirindo os contornos da ciência económica. De tal forma que esta gramática constituiu-se numa visão do mundo.
Um dos conceitos mais fortes com que a Economia povoou o nosso pensamento foi o de mercado ( livre). Este conceito constitui-se num modelo que é utilizado para pensar a realidade, definir estratégias de acção e gerar ideologias. Trata-se de um modelo que reside em certas assunções. Talvez a mais básica seja a de que o mundo é constituído por indivíduos livres. A crença que esses indivíduos detêm uma espécie de livre arbítrio significa que eles são a única fonte e os juízes dos seus desejos, e que esses indivíduos não estão sujeitos a constrangimentos para além daqueles que aceitam voluntariamente. Não há, consequentemente, nenhuma estrutura imperativa além do indivíduo, nenhuma grelha moral operativa que seja definitiva. Associado a este individualismo está a assunção de que as razões que levam as pessoas a desejar isto ou aquilo são irrelevantes. Tudo o que interessa é que elas desejam, com o corolário que deviam satisfazer esse desejo caso possam. A outra assunção chave é que as pessoas são pragmaticamente racionais. Essencialmente isto quer dizer que elas querem mais por menos.
O modelo descreve um mundo que consiste apenas em compradores e vendedores. Estes podem ser indivíduos ou organizações, e um actor que é comprador a dada altura pode ser vendedor noutra. Compradores e vendedores: ambos querem mais por menos, de tal forma que o conflito entre eles é inevitável. O comprador quer despender o mínimo de capital por um artigo e o vendedor quer cobrar o máximo de dinheiro por ele.
Uma das razões para que o modelo tenha a força e a capacidade de atracção que tem é o facto de estar enraizado no que está construído como a natureza humana fundamental. Seria, com efeito, o que as pessoas fariam espontaneamente caso fossem deixadas ao acaso, se a sua propensão para comercializar, trocar e cambiar não fosse constrangida. Estando alicerçado sobre uma concepção de natureza humana fundamental, o mercado pode ser utilizado para exprimir uma variedade de valores e pressupostos, muitos dos quais ajudam a explicar a atracção populista da ideia de Mercado Livre. Por exemplo, diz-se que o Mercado é uma protecção contra um Estado intruso e que, portanto, é o garante da liberdade pessoal. Diz-se também que permite que os compradores disponham de maior utilidade e satisfação do que teriam doutra forma. É uma fonte de eficiência, assegurando uma alocação de recursos mais racional. É o mais certo motor do crescimento económico e da prosperidade pessoal. Por detrás destas ideias está a ligação entre o Mercado e o ocidente liberal capitalista, o local com maior liberdade e riqueza que existe.
Importa salientar que conceitos como consumo, consumidor, mercado, aquisição, remetem para uma lógica economicista. Contra esta corrente, as ciências sociais têm procurado dar explicações para uma nova arena de relações sociais, onde se tecem identidades e sistemas de valor que contrariam a ideia de absoluta liberdade e racionalidade do consumidor da Economia. O que está em jogo é muito mais do que a lei da oferta e da procura. São os significados e os valores sociais – muitas vezes contraditórios – imbuídos na forma como nos relacionamos com os objectos que não produzimos. Quero dizer que o consumo, ao contrário de outros sistemas de intercâmbio de objectos, se define na sua natureza pela existência de um separação entre produtores e utilizadores. Uma pessoa consome porque apropria um objecto que não produziu (Carrier:1997).
Na nossa sociedade subsistem vários mitos sobre consumo. Um deles opõe a genuinidade das relações humanas ao materialismo dos bens de consumo. Este mito compreende as seguintes asserções: o consumo é baseado no materialismo como um desejo não razoável de bens; o consumo opõe-se à sociabilidade já que é baseado num interesse em objectos que substitui o interesse prévio pelas pessoas. Estamos cada vez mais dominados pelo mundo das compras e, como tal, diminuídos na nossa humanidade. Interessa aqui salientar que, tanto os grupos étnicos como as mercadorias devem ser compreendidas como objectificações utilizadas para criar e explorar projectos de valor. Como tal, relacionam-se com aspectos ou imagens ideais da pessoa humana. O que deve ser rejeitado é o argumento de alguns autores que debatem o pós-modernismo o qual aponta para a existência de um discurso sobre a autenticidade das pessoas, sendo este reduzido pelo campo não-autêntico das mercadorias. (Miller:1997). Os objectos, tal como as pessoas, têm histórias de vida. Nascem para uma comunidade e ao longo do tempo e vão adquirindo identidades que se transformam. Quando adquirem o estatuto de mercadorias o carácter dinâmico do que representam continua a subsistir. As mercadorias são geralmente vistas como representações materiais típicas do modo de produção capitalista. Na verdade, os objectos de consumo têm vidas sociais. A mercadoria (como conceito) é um estado no qual as coisas podem entrar e sair. Os objectos “candidatam-se” ao estado de mercadoria e isto refere-se aos padrões e critérios (simbólicos, classificativos e morais) que definem a capacidade das coisas serem trocadas em qualquer contexto social e histórico particular. As mercadorias representam formas sociais e distribuições de conhecimento bastante complexas. Em primeiro lugar, tal conhecimento pode ser visto de duas perspectivas: o conhecimento técnico, social e estético que existe na produção do objecto; e, por outro lado, o conhecimento que reside na apropriação da mercadoria através do consumo. O conhecimento de produção que é registado num objecto durante a sua realização é bastante diferente do conhecimento de consumo que dele é traduzido. As duas leituras irão divergir proporcionadamente à medida que as distâncias sociais, espaciais e temporais entre produtores e consumidores aumentam (Appadurai:1986).
Nas primeiras fases do capitalismo, o trabalho (assalariado) formava o corpo central do senso de identidade para a maioria das pessoas. Actualmente, são as mercadorias e os padrões domésticos de consumo que jogam um papel importante na construção social e cultural. É cada vez mais no conjunto das mercadorias trazidas à vida pelas práticas de consumo que objectivações morais, cosmológicas e ideológicas são construídas para criar as imagens pelas quais nós compreendemos quem somos, quem fomos e quem seremos ou deveremos ser no futuro. Uma identidade construída através do consumo oferece muito mais poder e é consideravelmente mais controlável do que uma identidade dependente da sua colocação dentro de sistemas de produção.
Temos que deixar de pensar o consumo como uma manifestação de escolhas individuais. A decisão básica que um indivíduo tem que fazer refere-se ao tipo de sociedade em que viver. As pessoas podem não saber muito bem o que querem quando vão às compras, mas certamente têm consciência do que não querem. Para compreender as práticas de consumo temos que delinear as aversões estandardizadas – que são muito mais constantes e reveladoras que os desejos. Os artefactos são seleccionados para demonstrar a preferência. O penteado, os sapatos, a cosmética – assim como outras mercadorias - , assinalam afiliação cultural. (Nava:1997:73; Miller:1995; Bocock:1993; Douglas:1997).
Referências:
APADURAI, Arjun, 1986, The Social Life of Things, Cambridge University Press , Cambridge.
BOCOCK , Robert , 1993 , Consumption , Routledge , London & N. Y..
CARRIER, James, 1997 , Meanings of the Market , Berg , Oxford.
DOUGLAS, Mary, 1997, “In Defence of Shopping” In The Shopping Experience, Sage, London.
MILLER, Daniel, 1995, “ Consumption as the Vanguard of History” In Acknowledging Consumption , Routledge , London & N. Y..
MILLER, Daniel, 1997, Capitalism – An Ethnographic Aproach, Berg, Oxford , N. Y..
NAVA, Mica, 1997, “Modernity’s Disavowal : Women , the City and the Department Store” In The Shopping experience , Sage , London , T. O. , N. D..

Factores que Orientam a Selecção de um Bem de Consumo


- A construção das identidades pessoais através da escolha do objecto. O produto A é conotado com um grupo humano especifico (α) com uma identidade reconhecida. Optar por A é uma afirmação de pertença a α.
- A estética do objecto. Este factor divide-se em duas partes :
a) os aspectos formais e cromáticos (simetrias e cores), os quais dependem da estruturação visual da sociedade em causa.
b) A relação entre a aparência do objecto e os “modelos” visuais existentes (estilos, “modas”, etc).
- O “tipo” de objecto. Escolher um martelo é diferente de escolher um chocolate. Cada objecto existe socialmente através da noção que as pessoas têm dele. A noção é o objecto na sua forma social – a função que oferece, o contexto social no qual deve ser utilizado, o valor simbólico, etc.
- O custo monetário do objecto. “Custo”, “poupança” e “lucro” não são simples operações matemáticas. São noções culturais específicas dos grupos modernos. “Poupar” não é simplesmente gastar menos dinheiro. É uma noção que pode ser manipulada levando, muitas vezes, o consumidor a despender mais recursos para obter o objecto.
- O valor (importância) do objecto. Noções como “raridade”, “genuinidade” e “qualidade” podem aumentar ou diminuir a importância que um determinado grupo humano confere a um objecto.
- A ideia de necessidade. Porque é que um objecto é considerado necessário? As necessidades variam de grupo para grupo e enquadram-se nas práticas e valores específicos. Uma empresa pode “inventar” uma necessidade através da publicidade, mantendo desta forma uma relação constante do grupo humano com o produto.
- As marcas. Uma empresa procura, normalmente, associar à sua marca imagens e valores que aumentem a importância do produto. A marca, desta forma, transforma-se num símbolo e num elemento de evocação de aspectos como qualidade, genuinidade, poupança, etc. Frequentemente, as marcas procuram evocar formas de prazer e realização pessoal, mantendo uma relação constante com a manipulação do desejo.
- As rotinas dos consumidores (hábitos de consumo).
- O poder que o objecto oferece (liberdade, capacidade de usar a imaginação…). É que, tirando aquelas vezes em que compramos por rotina, nós procuramos o poder e o prazer (os dois principais princípios da motivação). Por vezes, o objecto actua como elemento de distinção, ou seja, faz sobressair (eleva) o proprietário em relação a outro grupo menos valorizado.

domingo, maio 09, 2010

Para quem é autodidacta

Se o estimado visitante é uma das muitas pessoas que procura cultivar o espírito por iniciativa própria, ou seja sem tutores nem percursos escolares ou académicos, este artigo é para si. A maioria dos autodidactas exerce a sua actividade de aprendizagem adquirindo livros sortidos e, eventualmente, pedindo informações às pessoas com quem se relaciona. Esta actividade é extremamente estimulante e confere liberdade a quem a pratica. Demasiada liberdade, como verá.
Ser responsável pela sua própria formação acarreta vários riscos. Pode ficar com lacunas importantes, adquirir conhecimento desactualizado, formular conceitos fantasistas, etc. O pior que lhe poderá acontecer é ter a sensação que possui um vasto conhecimento porque leu muitos livros ou porque tem a cabeça cheia de ideias. A vaidade intelectual, o chamado pedantismo, é dos piores inimigos de quem quer aprender.
A primeira coisa que deve ter em mente é a distinção entre aprender e armazenar conhecimentos. Se você quer ser um erudito, um armazém de “factos”, então este artigo não é para si. Há uma metodologia específica para adquirir Cultura Geral, muito útil a quem, por exemplo, deseja ganhar dinheiro em concursos televisivos.
Aprender é, acima de tudo, a transformação de um prisma. Quem aprende modifica a sua maneira de ver o mundo. Adquire novos esquemas interpretativos que lhe permitem decifrar o real de forma mais precisa. Por isso, aprender é tornar-se mais competente no processo de compreensão. Para aprender é necessário ler livros ou ir à escola? Claro que não. Desde que nascemos, tomamos contacto com o que nos rodeia e vamos adquirindo novas formas de classificar a realidade, interpretando-a.
Quando a aprendizagem foca o conjunto de conhecimentos instituídos disciplinarmente pelas Ciências e Humanidades, a forma como se transmite a informação tem metodologias próprias e obedece a critérios diferentes do senso comum. Não convém que seja uma aventura solitária, senão o explorador arrisca-se a ser engolido pela própria Natureza que deseja desbravar.
Sejamos optimistas e acreditemos que há navegadores solitários que conseguem chegar em segurança ao destino. Para ser um autodidacta bem-sucedido precisa de ter em conta vários aspectos.
Quando alguém entra numa livraria, a sua atenção recai sobre títulos e temas para os quais já está sensibilizado. No caso de um leigo que procura bibliografia sobre uma determinada matéria, os seus sentidos serão estimulados pelos assuntos que consegue compreender e, sobretudo, pelos conteúdos que concordam com a aprendizagem do senso comum, operada pelos meios de comunicação social, sociabilidade, etc. Temas que desconhece por completo não lhe abrem o apetite. Esta situação é uma das principais responsáveis pelas lacunas que a maioria dos autodidactas demonstra. O autodidacta só lê o que lhe apetece e não o que lhe seria mais útil.
Em segundo lugar temos o problema do método. A ordem de leitura não deve ser arbitrária e muito menos aleatória. Se você se interessa por um determinado autor, nunca pegue nas suas obras indiscriminadamente. Se o fizer, corre o risco de não compreender a evolução do pensamento desse autor e de não o conseguir enquadrar no contexto a que ele pertence. O ideal seria pedir ajuda a alguém que tem formação na área, no sentido de lhe indicar quais as obras que você deve ler e qual a ordem de leitura. Se não puder obter a tutória de um amigo ou conhecido, pegue numa enciclopédia e procure as entradas que dizem respeito ao tema. Regra geral, as enciclopédias oferecem uma visão panorâmica sobre os assuntos, que lhe permitirão inicialmente encarar a temática de forma abrangente e inserida num contexto, para que posteriormente possa ir estreitando as áreas de interesse. Portanto, um artigo numa enciclopédia pode ser uma introdução valiosa ao tema que pretende estudar e até um guia, uma vez que fornecem informações adicionais, como indicações para outras entradas ou sugestões de leitura.
O importante é começar com uma boa introdução, uma leitura que dê uma perspectiva geral do assunto e que o sensibilize para os diversos aspectos que constituem toda a complexidade da área em estudo. Um bom edifício dispõe sempre de uma antecâmara suficientemente ampla que permita aos recém-chegados visualizar a estrutura interna do prédio e, com a devida sinalização, evita que os visitantes percorram caminhos errados.
Outro aspecto a ter em conta é a credibilidade das obras. Não é por estar numa livraria frequentada pelas elites que um livro adquire qualidade. Comece por folhear a obra e veja se está bem organizada. O índice consegue ser funcional, ou seja, ajudar o leitor a orientar-se no texto? O autor está bem referenciado? Consegue-se perceber quem é, o que fez para chegar àquela obra, que trabalho desenvolveu dentro da área disciplinar? As consultas citadas pelo autor estão bem referenciadas? Há anotações? Quem tem prática a escolher livros já conhece as características que dão credibilidade a uma edição. Todas se resumem a uma qualidade: rigor. Boas edições estão bem organizadas e pautam-se pelo rigor aos mais ínfimo pormenor. Fuja de livros com títulos sensacionalistas como «A História misteriosa de…» ou «Grande livro do…», que procuram chamar a atenção dos mais ignorantes.
Quando se trata de livros científicos, o rigor é ainda mais necessário. Não corra riscos. Procure alguém com formação científica na área e peça-lhe ajuda. A data da edição também é importante quando estamos a lidar com um domínio científico que está em acelerada actualização e cujos conhecimentos se tornam desactualizados rapidamente. Hoje em dia, quase todos os campos científicos estão em constante mutação e, por isso, o conhecimento que era aceite há 3 anos deixou de o ser ontem à tarde.
Nunca compre livros sobre assuntos muito diversos de uma assentada. Um livro não é comparável a um fruto. Por isso, adquirir bibliografia não é o mesmo que preparar uma salada de fruta. Concentrar a sua atenção em áreas muito distintas pode ser prejudicial até para a sua saúde mental. Não estou a brincar. A nossa mente é um engenho de produzir analogias . Se você ler agora um livro sobre a organização social das abelhas e logo a seguir outro sobre a vida de Dostoievski, a sua mente irá necessariamente relacionar informação proveniente das duas obras. O resultado é o que acontece a muitos autodidactas: “descobrem” que têm teorias absolutamente revolucionárias, capazes de mudar o mundo. Outro dos “sintomas” característicos manifesta-se pelo carácter fragmentário do conhecimento. É vê-los nos cafés a debaterem com os amigos, saltitando de assunto em assunto, com argumentos de 15 segundos. Tornam-se incapazes de desenvolver um argumento, mas muito populares em tertúlias ou conversas de café. O problema da “Cultura Geral” é que se manifesta sabendo um pouco de tudo. Só que na maioria das vezes, o pouco é mesmo muito pouco. Eu chamo a isto “o intelecto fragmentado do autodidacta”.
Não queremos que a nossa mente seja uma manta de retalhos, mas sim um instrumento cada vez mais aperfeiçoado e capaz de interpretar a realidade.
Ponha à prova os seus conhecimentos. Desenvolva um argumento e coloque-o perante uma comunidade que se dedica a estudar o mesmo assunto. Os outros membros indicar-lhe-ão os erros de estudo que eventualmente terá cometido e colocá-lo-ão perante argumentos que contradizem o seu. O valor de uma teoria mede-se pela capacidade de sobrevivência perante a crítica. Estudar em comunidade também lhe permitirá beneficiar da ajuda de terceiros. As comunidades de conhecimento servem para que os membros se ajudem mutuamente.
Nunca tema as críticas. São elas que o ajudarão a evoluir. Não procure elogios. O ego e o conhecimento são inimigos radicais. A vaidade levá-lo-à à ilusão do saber, à cegueira do diletante.
O estimado visitante não quer ser, de certeza, como uma personagem de Sartre da obra A Náusea. O Autodidacta de Sartre pretendia ler os livros todos que havia numa biblioteca pública, por ordem alfabética...

quinta-feira, dezembro 24, 2009

Como Proteger o Seu Computador ou a Sua Página na Web (para iniciantes)

Comece por imaginar que a sua propriedade (PC ou Web Site) constituem uma cidade que pode estar sob ameaça de ladrões ou invasores. Eu costumo explicar este processo recorrendo à Guerra de Tróia. O seu papel é o de monarca troiano, a quem compete zelar pela segurança da cidade. Os gregos seriam os oponentes, aqueles que querem tomar conta do que não lhes pertence.
A primeira barreira é a muralha que, em princípio é inexpugnável. São os portões (bem guardados) que controlam as saídas e entradas. No caso de um computador, à muralha dá-se o nome de firewall. A firewall é um programa que, uma vez instalado no seu computador vigia o tráfego entre o seu PC e o mundo exterior. Há comunicações autorizadas e outras que são simplesmente barradas. Portanto, esta é a primeira linha defensiva e que merece toda a sua atenção. Há firewalls gratuitas e outras com valor comercial. Eu cá prefiro a Zone Alarm porque a minha experiência me diz que funciona lindamente e não é nada complicada de gerir. E ainda por cima é gratuita. Mas vale a pena experimentar outras. As mais avançadas vigiam todos os programas instalados no computador e, de cada vez que um tenta entrar em contacto com o exterior, perguntam ao utilizador se autoriza ou não que a comunicação seja estabelecida. Ainda há algumas, mais completas, que protegem a integridade dos seus programas. Sempre que um dos seus programas está em vias de sofrer uma transformação, a firewall interrompe o processo e pergunta ao utilizador se autoriza que o programa seja modificado.
Como não há muralhas perfeitas (e a Guerra de Tróia demonstrou isso mesmo, uma vez que foi ludibriada pelo célebre cavalo de madeira construído por Ulisses), tem que haver um policiamento no interior da cidade (do PC neste caso). O papel do antivírus é precisamente policiar o seu computador à procura de programas invasores que tenha conseguido ultrapassar a muralha defensiva. A firewall e o antivírus complementam-se na tarefa de manter o seu sistema seguro. O que não falta no mercado são antivírus, que variam na marca e no preço. Para se entender a qualidade de um antivírus, parta dos seguintes critérios: precisão na detecção de programas indesejáveis. Alguns detectam mal (ou não detectam) a presença de vírus e outros produzem falsos alarmes a torto e a direito, o que deixa o utilizador quase paranóico, com a sensação que estão a aparecer ameaças de toda a parte. O meu preferido é o Kaspersky. É fácil de configurar e tem uma precisão espantosa. Detecta todas as ameaças e não emite alarmes falsos.
Há programas especializados em detectar ameaças muito específicas, para além dos vírus. Hoje em dia, a detecção de todo o tipo de programas maliciosos já vem incluída no antivírus.
Mantenha sempre os seus programas actualizados, especialmente o antivírus e a firewall. Ainda está para nascer um programa sem falhas e são precisamente esses pequenos “defeitos” que os hackers exploram para invadir seu computador. A maioria das empresas de software disponibiliza frequentemente actualizações que visam corrigir pequenos erros que podem ser explorados por hackers.
Tenha cuidado com as páginas que visita na Web. Os que têm pouca credibilidade, lançam muitas vezes programas maliciosos para o computador do visitante. Os sites pornográficos costumam ser os mais inseguros.
As recomendações que delineei até agora são suficientes para o comum utilizador, aquele que não tem no computador documentos com valor económico ou informações que carecem de secretismo.
A maioria dos hackers são adolescentes que dominam técnicas básicas de invasão. Só conseguem invadir sistemas desprotegidos com utilizadores inexperientes. Perante uma boa firewall e um bom antivírus eles são completamente impotentes,
Os outros hackers, que têm conhecimentos avançados de informática e que, muitas vezes trabalham em equipa, não vão despender o seu precioso tempo a invadir o computador do vizinho. Querem é obter informações que os ajudem a ganhar dinheiro.
Portanto, o invasor tem quase sempre a dimensão do sistema que pretende atacar. Os miúdos querem é atacar sistemas e dar cabo de páginas web para depois se andarem a gabar aos amigos, convencidos que são uns autênticos génios da tecnologia. Os outros atacam empresas, corporações, sistemas governamentais e regem-se pela lei do silêncio.
Assim sendo, ao utilizador comum resta-lhe seguir as recomendações já descritas, para fazer a sua vida de cibernauta em paz e sossego.
Certifique-se também que a página do email onde insere o nome de utilizador e a palavra-passe é mesmo legítima, porque pode ser deparar com uma página igualzinha mas que foi criada pelo hacker para obter os seus dados confidenciais.

sexta-feira, novembro 06, 2009

Consumption, James Carrier

Consumption is the meaningful use people make of the objects that are associated with them. The use can be mental or material; the objects can be things, ideas or relationships; the association can range from ownership to contemplation. This definition is broad and vague because anthropologists have been less concerned with defining their approach to consumption than with rejecting two previous approaches, those of conventional economics and Marxian *political economy. Researchers criticize these approaches for ignoring the social and cultural processes that underlie needs, generate demand and are satisfied in consumption (Douglas and lsherwood 1978; Sahlins 1976). While anthropologists recognize that some needs have a material basis, they stress the fact that need and demand reflect the ways objects facilitate social relationships and define social identities (e.g. Douglas and lsherwood 1978: ch. 5).
Scholars have long reflected on the meaningful use of objects. tMax Weber and tThorstein Veblen are two examples from around the beginning of the twentieth century. Despite this history, the systematic social study of consumption is relatively recent, being overshadowed by the study of social organization and production. Social science encyclopedias of the mid-1980s could still discuss consumption solely in economic terms.
One key concern of students of consumption is the way that objects carry significant social meanings. Just about ali objects have always carried such meanings to a degree. However, many argue that these meanings became especially pronounced in the West around the time ofthe rise of *capitalism and mass production; so much so that the West became a consume r society. This period saw a change in the way that Westerners thought about objects, as the symbolic gratifications of consumption loomed larger in people's minds (Campbell 1987). This change was facilitated and exploited by commercial firms, themselves growing larger and more aggressive (McKendrick, Brewer and Plumb 1982). Prominent among these were retail merchants, who were beginning to place their wares in novel and exotic displays in order to generate sales. This was especially true of department stores, the retail merchants who have attracted the greatest scholarly attention (Williams 1982).
For individuais, the first step in consumption is appropriation, establishing a mental association with the objects to be consumed. ln capitalist societies this means that *individuals transform objects from being impersonal commodities into things with distinctive meanings for the consumers and distinct places in the consumers' social lives (Carrier 1990; Miller 1987). Once appropriated, people can use the objects to define their place in different social units. For example, the clothes one wears can be important for defining one's gender, social rank, ethnic identity and a host of other social attributes. Less obviously, when and how one eats can be important for defining social cycles of time, whether time of day, season of the year or ritual cycles (Douglas and lsherwood 1978). The cumulative effect of these individual acts of definition is a common structure of consumption at the societal leveI. This structure of consumption in turn reflects and recreates the identities of social groups that consume in distinctive ways, as well as the differences between those groups (Bourdieu 1984).
Students of Western societies tend to focus on the way that consumption creates the distinction between different entities like *classes or *ethnic groups, probably because mass consumption is so established in the West. On the othêr hand, mass consumption in the Third World is relatively new, and research there tends to focus on the way that consumption creates novel social identities and entities. Many assert that the spread of Western consumables into Third World countries does not, as some had argued and feared, lead to homo-geneous Westernization. Instead, it leads to the creation of national hybrids (Hannerz 1987; Foster 1991). These hybrids consist of interpretations and adaptations of Western products developed and shared by indigenous people themselves. Such hybrids can generate common national consumption communities that displace pre-existing sub-national or colonial patterns, and so are important in creating the nation itself as a social and cultural entity (Wilk 1995). Equally, those national patterns can become self-sustaining. This can happen when fringe groups within the country adopt national consumption patterns in order to assert their membership in the emerging nation (Hirsch 1990), a process which increases the impartance of those national consumption patterns.
As the study of consumption matures it will need to address two issues. One is the denotation of 'consumption' itself, which seems at times to mean little more than 'not production'. This broad, vague, implicit definition is fertile, but is unlikely to help scholars develop a coherent view of the subject. The othei:- issue is more complex. At present researchers tend to investigate the ways that people impose meaning on the objects in their lives. However, many such objects come with complex structures of meaning already in them, such as song and television programmes,' or already attached to them through advertising and global cultural imagery, such as soft drinks and sports goods. If they are to develop a rounded account of consumption, scholars will need to address ways that these pre-existing meanings affect those ~ho consume the objects that carry them. JAMES G. CARRIER
In Encyclopedia of Social and Cultural Anthropology, Alan Barnard & Jonathan Spencer (Eds), Routledge

sexta-feira, outubro 09, 2009

Crítica à sociedade de consumo (imagens)


Estes cartazes alertam para o perigo do consumo e para excessiva influência que tem na nossa sociedade. Uns acusam o consumo de estar a destruir as relações sociais verdadeiras, substituindo-as por algo que é artificial, feito em série.Outros focam a destruição do meio ambiente.

domingo, outubro 04, 2009

Uma Introdução ao Hacking

Este artigo não pretende fomentar o crime informático, mas sim dar a conhecer uma realidade importante nos nossos dias. A palavra ‘hacking’ é aqui utilizada como sinónimo de um processo utilizado por alguém que procura invadir um sistema informático. Para trás ficam as outras definições, favorecidas pela riqueza da palavra, como ‘criativo’, ‘programador’ ou ‘especialista em segurança’.
É óbvio que, quanto mais amplos forem os conhecimentos de informática, maiores são as opções do hacker. No entanto, é possível dar os primeiros passos nesta arte negra sem saber programar, por exemplo. As técnicas estão facilitadas hoje em dia graças à existência de programas que fazem quase tudo e que podem ser utilizadas por qualquer pessoa, incluindo o utilizador que não tem conhecimentos profundos de Informática. Este artigo procura dar a conhecer tais programas, em que consistem e como se utilizam para invadir uma rede.
O primeiro passo de qualquer hacker consiste em recolher informações sobre o sistema que pretende conquistar. Inicia, portanto, o processo recolhendo dados técnicos ou de outra natureza que lhe permitirão descobrir uma forma de penetrar na “fortaleza”. Repare, caro leitor, que para descobrir uma palavra-passe, por vezes, basta iludir a pessoa que a detém levando-a a revelar-nos o segredo. Para isto nem é preciso ligar o computador. Basta entrar em contacto verbal com a vítima e ter uma “boa lábia”, a capacidade de criar uma conversação nos nossos moldes. Em português chama-se a esta técnica “tirar nabos da púcara”, mas os hackers preferem um nome mais sofisticado: engenharia social. Acredite, estimado leitor, que muitas invasões são praticadas por indivíduos sem grande perícia técnica, mas peritos na arte de “bem conversar”.
Deixemos agora o doce linguajar e rumemos aos tais programas de que lhe falei. A primeira classe de programas que deve conhecer é a dos scanners.
Um scanner é, por definição, um dispositivo que “sonda” outros computadores, redes ou outro tipo de hardware e que permite recolher informações. Há dois tipos de scanner: os que sondam redes inteiras e que, no final do processo lhe oferecem um relatório com as características da rede e das máquinas por ela interligadas (scanners de rede); e os scanners que pesquisam vulnerabilidades num determinado hospedeiro (um computador, por exemplo). Estes últimos, denominados scanners de vulnerabilidades, procuram no computador da vítima informações que possam ser exploradas pelo atacante para levar avante os seus intentos. Há muita variedade neste campo de software. Eu sugiro apenas estes:
Nmap – para utilizadores de Linux
GFI LANguard – para utilizadores de Windows


Imagem: GFI Languard

Ao utilizar estes programas não se está a cometer nenhum crime. É como estar na rua, diante de uma casa, observando tudo o que se passa. Ninguém vai preso por analisar, a partir do exterior, uma habitação, ainda que preste especial atenção a janelas e portas abertas, fechaduras, etc. No entanto, caro leitor, recomendo que não use os scanners para investigar organizações governamentais ou de empresas. Têm sempre equipas de segurança e basta estar a “olhar” para lá para que se torne suspeito. Se fizer um scanning à NASA, não se admire de, passado algum tempo, ter uns agentes a bater-lhe à porta.
Após ter recolhido informações sobre o sistema que pretende invadir, precisará de uma outra classe de programas para “arrombar a porta”: os exploits. Qualquer software instalado num computador tem a capacidade de…errar! A sua vítima tem no PC programas que terão comportamentos imprevistos se receberem instruções para as quais não estão preparados. Um exploit é um programa que executa instruções no computador da vítima, que geram erros num determinado software que lá está instalado, e que podem ser utilizados a favor do atacante. Há exploits para todos os gostos. Os hackers, espalhados pelo mundo inteiro, já se deram ao trabalho de encontrar vulnerabilidades em todo o tipo de software e de criar exploits que exploram os pontos fracos dos programas.
O sítio milw0rm (http://www.milw0rm.com/) é um verdadeiro armazém de exploits que qualquer pessoa pode descarregar para depois utilizar contra outro computador.


Imagem: exploit em execução

Há outra classe de programas, a que eu chamo tudo-em-um, que fazem o scanning da máquina-alvo e que contêm também exploits para invadir. Ou seja, recolhem informações e depois atacam, “automatizando” o processo de assalto. Recomendo dois:
- O Metasploit (gratuito) http://metasploit.com/
- O Core Impact (caro e não está acessível a qualquer pessoa) http://www.coresecurity.com/content/core-impact-overview

A partir do momento que o atacante entrou no computador da vítima, tem duas opções: faz o que tem a fazer no momento ou então tem que arranjar uma maneira de poder voltar lá mais tarde sem ter o trabalho inicial. Para poder voltar ao “local do crime” as vezes que forem necessárias, recomenda-se a utilização de outra classe de programas: os Cavalos de Tróia. Um Cavalo de Tróia é sempre constituído por dois programas. O primeiro (denominado servidor) é instalado no PC da vítima; o outro actua no computador do hacker (chamado cliente). Os dois programas comunicam um com o outro e permitem que o invasor tenha o controlo completo da máquina que invadiu. No seu computador, o hacker abre a “sua parte” do Cavalo de Tróia (cliente) e fica diante de si com um painel de opções. Dentro das muitas (inúmeras opções) do painel contam-se: transferir ficheiros de um PC para o outro, tomar conta do rato, abrir as gavetas de CD (os hackers gostam destas brincadeiras), gravar tudo o que se passa (incluindo imagens de webcam) ou simplesmente apagar todo o conteúdo guardado no computador (formatar os discos).


Imagem: Cliente do Cavalo de Tróia NetBus (antigo)









Pode acontecer que o hacker tenha diante de si um ficheiro que está protegido por palavra-passe. Para “quebrar” as senhas existem programas específicos (password crackers), cada um especializado no software para o qual foi programado. Há de tudo: para quebrar senhas do Word, Pdf, Zip, do próprio Sistema Operativo, etc. Nem sequer vou aqui sugerir alguns, uma vez que a oferta destes programas é imensa. Escreva no Google “password cracker” seguido do nome do programa que pretende desvendar (por exemplo, “password cracker Windows”, para ter diante de si vários programas que descobrem as palavras-chave do famoso Sistema Operativo da Microsoft).

Invadir uma página da Web pode passar por utilizar métodos já aqui descritos (como os exploits, para invadir o servidor onde está hospedada a página), a Engenharia Social (a tal “lábia” que leva uma pessoa a dizer o que não deve), um Cavalo de Tróia (o hacker tem acesso ao PC da vítima e, consequentemente, às palavras-chave) ou então utiliza um processo denominado phishing, que consiste em criar uma página de login igualzinha à que o utilizador vê diariamente e dela se serve para estabelecer ligação com a página Web. O resultado é que a vítima vê uma página que julga ser real e na verdade é um embuste criado pelo hacker. Introduz os seus dados, como está habituado a fazer, e estes são enviados para um e-mail que pertence ao bandido. Não irei aqui descrever ao pormenor como se cria uma destas páginas falsas. Em traços largos, basta copiar para o seu computador a página de login do site (clique com o botão direito do rato na página e escolha “guardar página como”) e, uma vez tendo uma cópia no seu computador, pode alterar o HTML de forma apropriada. Depois, hospeda o seu “trabalhinho” num servidor e envia para a vítima o link da sua página falsa (por e-mail, por exemplo). Ao clicar no link, o utilizador verá uma página de login igual à que usa todos os dias. A diferença é que, ao inserir o nome de utilizador e a password, estas serão enviadas ao assaltante.
Ao descrever estas técnicas procurei dar-lhe uma ideia de como “a coisa funciona”. Há inúmeros recursos na Internet, incluindo aulas em vídeo que explicam de forma muito simples como se executa os processos aqui descritos e outros. Há cursos inteiros de hacking.
Finalizo esta breve introdução sugerindo-lhe dois fóruns, em Português do Brasil, que lhe poderão ser úteis.
http://www.forum.darkers.com.br/
http://www.invasao.com.br/